Quando a Ana lançou o desafio de escrever para este portal nem pensei duas vezes em voluntariar-me. Tenho 40 anos e voltei no ano passado à faculdade. Trabalho, sou casada, tenho dois filhos, e para iniciar nesta fase da minha vida este novo ciclo, tenho também uma ponta de loucura garantida. Estudar na vida adulta tornou-se uma realidade.
Há vinte anos atrás passei brevemente pelo ensino superior em duas alturas diferentes. Na primeira, acabada de sair do secundário, cometi um erro terrível. Em vez de ir pelo curso que me apaixonava verdadeiramente optei pela saída que toda a gente dizia que dava trabalho, dinheiro, prestígio e outras coisas que nos dizem que queremos.
Recordo-me perfeitamente que no momento de preencher o impresso cor-de-laranja com bolinhas e códigos foi o meu racional que ganhou ao coração e ao invés de colocar Filosofia como primeira opção coloquei Comunicação Empresarial na ilusão de que seria o melhor a fazer.
Estudar na vida adulta
Três meses depois sairam os resultados, e com uma média razoável entrei para a opção racional. Escusado será dizer que foi um fiasco total.
Uns cinco anos mais tarde, já com trabalho fixo voltei a fazer os exames nacionais e entrei para Filosofia. Como fixo neste país não é sinónimo de estável, uma não passagem à efectividade e consequente desemprego colocou uma pausa por tempo indeterminado na faculdade. Nos quase três meses que vivi no meio académico, no curso que sempre quis, ficou claro para mim que mais cedo ou mais tarde iria voltar ali. Congelei a matrícula e fui à minha vida.
Actualmente trabalho como Coach, um trabalho super gratificante, que consiste em ajudar os outros a realizarem os seus sonhos. E cliente após cliente, com o sucesso e a felicidade deles tornou-se impossível ignorar aquela vozinha lá no fundo que me dizia “e tu? está na hora de realizares aquele sonho, não achas?!”. Pensei, ponderei, analisei e planeei, mas confesso que desta vez foi com o coração ajudado pela razão e não o contrário.
Continuo a ouvir os clássicos: “Filosofia para quê?”, “Isso não tem saída.” ou “Para que é que queres esse curso, porque não psicologia?”; aos quais se juntaram: “Tens dois filhos pequenos, não vais ter tempo.”, “Estás maluca, e o trabalho? E o marido? E os filhos?” ou o sempre motivador: “Vais demorar dez anos a fazer o curso.”
O azar das pessoas que me dizem estas coisas divide-se em dois: primeiro, já não tenho propriamente dezoito anos verdinhos, depois, modéstias à parte, sou uma excelente Coach de mim mesma.
Filosofia foi a única coisa que me apaixonou verdadeiramente no secundário. Se a escolha tivesse sido outra provavelmente hoje seria uma investigadora de filosofia antiga, perdida entre manuscritos e fragmentos a traduzir Platão do grego. As saídas estão onde nós as encontramos. E quando não encontramos é agarrar nas ferramentas adequadas e construir janelas, portas ou o que quer que funcione – houve malta que fugiu de Alcatraz, qual é a vossa desculpa???
Psicologia não é Filosofia. Compararem sequer as duas dá-me azia – nada contra a psicologia, mas não é de todo a mesma coisa. E a resposta ao para quê é a mais fácil: para tudo. A Filosofia está em tudo, faz parte da Humanidade, e quiçá da sua salvação face à AI, a todas as automatizações, ao virtual, aos zeros e uns (o que by the way vai ser o tema da minha tese, fica já aqui o registo).
Numa coisa têm razão os meus detractores, tenho dois filhos pequenos sim, um com cinco e uma com sete. E eles são só mais uma razão para voltar a estudar, quero dar-lhes o exemplo de que os sonhos de realizam, mais cedo ou mais tarde, com mais ou menos entraves. Ocorre-vos razão melhor?
O marido e a família apoiam-me, e se há coisa que se aprende com a idade é que “it takes a village”. O trabalho, a outra paixão da minha vida, é a parte mais fácil. E sim, é bem possível que demore dez anos a fazer o curso, mas se há alguma convicção inabalável na minha vida é que o vou acabar.
Por estes motivos todos, e por mais alguns proponho-me a partilhar neste espaço uma perspectiva sobre o mundo universitário que não é a tradicional. Podem-me chamar a cota de serviço que eu não me chateio nada. Conhecer os pros e os contras de voltar a estudar, perceber as principais mudanças no ensino superior na era digital, saber como gerir trabalho/estudo e família ou o que raio foi feito das sebentas são alguns dos próximos posts.
Até breve!